"Até os cabelos da cabeça de vocês estão todos contados."
(Lc 12, 7)
Filme vencedor de 4 Oscar.
Esse filme trata principalmente do itinerário espiritual de um garoto curioso chamado Piscine Molitor Patel, vulgo Pi. Numa entrevista com um escritor, Pi conta toda a sua vida, desde a explicação do estranho nome Piscine, que vem de uma piscina parisiense, ao resultado de um naufrágio em que o protagonista perde mãe, pai e irmãos.
Na infância Pi conta como superou as gozações dos colegas pelo fato de se chamar Piscine. Nesse contexto ele explica todo o esforço que teve para associar seu nome à letra grega
, o rápido relacionamento com uma dançarina hindu e o mais importante: a descoberta das três religiões que o acompanharam durante a vida, o hinduísmo do qual aprendeu a devoção, o islamismo do qual aprendeu a ver Deus em todas as coisas e o cristianismo do qual aprendeu a amar.
Em um diálogo familiar, Pi é aconselhado por seu pai sobre a necessidade de fazer escolhas na vida, por mais difíceis que elas sejam. Pi decide então ser batizado, ainda que a experiência positiva com as outras religiões moldassem sua forma de encarar as dificuldades da vida. Interessante notar que o fato de Pi ter conhecido diferentes religiões, parecidas e discordantes entre si, não o impediu de tomar uma decisão livre de qualquer pressão. Uma delas o convenceu na busca da verdade num processo parecido com o que explica João Paulo II na encíclica Fides et Ratio:

Em um diálogo familiar, Pi é aconselhado por seu pai sobre a necessidade de fazer escolhas na vida, por mais difíceis que elas sejam. Pi decide então ser batizado, ainda que a experiência positiva com as outras religiões moldassem sua forma de encarar as dificuldades da vida. Interessante notar que o fato de Pi ter conhecido diferentes religiões, parecidas e discordantes entre si, não o impediu de tomar uma decisão livre de qualquer pressão. Uma delas o convenceu na busca da verdade num processo parecido com o que explica João Paulo II na encíclica Fides et Ratio:
A sede de verdade está tão radicada no coração do homem que, se tivesse de prescindir dela, a sua existência ficaria comprometida. [...] Por certo, nem toda a verdade adquirida possui o mesmo valor; todavia, o conjunto dos resultados alcançados confirma a capacidade que o ser humano, em princípio, tem de chegar à verdade.

Obviamente, como vocês já devem imaginar, da chamada "Arca de Pi" (metáfora da Arca de Noé) só sobrou o tigre e o então adolescente Pi. Com o tempo Pi teve de aprender não só a sobreviver às intempéries do mar como a domar o tigre faminto. É muito fácil perceber que o período que Pi passou com o tigre no mar foi uma bela demonstração das virtudes teologais: a fé, a esperança e a caridade. Pi exercitou o dom da fé substituindo as quase obrigatórias murmurações por diálogos e até discussões com Deus; cultivou a esperança por meio das simples instruções de um manual de sobrevivência; e o mais importante: Pi não se fez de coitadinho nem descontou a raiva, o abandono e o desespero no tigre com quem conviveu durante todo esse tempo.
O filme consegue, ademais, traduzir magistralmente as provas de fé a que Deus nos submete diariamente: sempre que tudo parece humanamente perdido, a ajuda vinha mesmo que de modo imperceptível. O filme mostra que Deus é humilde até em sua providência. Não há teletransportes, água do mar transformada em vinho, peixe transformado em filé mignon, etc. A lição é sobretudo a que temos de estar atentos aos movimentos divinos. Esse exercício ou prova divina repete-se ao longo de toda a "Aventura de Pi": o barco naufraga, porém só ele sobrevive; Pi está abandonado em meio ao mar, porém há um manual de sobrevivência com suplementos para dias; a comida começa a acabar, porém acha-se uma ilha para abastecimento e por aí vai. O mais importante é estar atento a esses "poréns" de Deus a despeito de todas as circunstâncias e isso é uma grande lição para os crentes.
Nas últimas cenas, o já adulto Pi, que é entrevistado por um escritor conta que logo após o naufrágio teve de explicar a alguns representantes da seguradora como ocorreu o desastre e como ele conseguira sobreviver tanto tempo no mar, algo considerado impossível. Depois de explicar detalhadamente, Pi percebe o estranhamento no rosto dos representantes que prontamente solicitam uma história mais plausível para ser registrada nos arquivos. Pi então reconta a história substituindo os animais do bote por pessoas. A atitude de cada animal: da hiena, do orangotango, da zebra e do tigre são substituídas pela atitude de pessoas por ele inventadas na tentativa de parecer mais convincente dessa vez. No final, Pi questiona o escritor: "qual é a melhor história? A história com animais ou sem animais?". O escritor responde: "A história com animais é uma história melhor". E então Pi responde: "e assim aplica-se a Deus".
Como uma obra de arte, não convém tentar explicar ou impor uma visão pessoal da cena retratada, mas esse final talvez seja a chave do entendimento da proposta do filme. Dentre duas histórias "inverossímeis", humanamente fantásticas, inacreditáveis, onde não há espaço para a racionalização dos fatos, uma delas parece ser mais adequada cientificamente falando. Mas isso não quer dizer que seja a história verdadeira. Talvez o roteirista quisesse provar que a ciência também tem seus limites. A ilha carnívora relatada por Pi não existia em nenhum mapa, mas só por isso deveríamos presumir que ela não existe? Não há artigos científicos demonstrando o comportamento de um tigre de bengalas convivendo com um homem durante 200 dias em mar aberto. Portanto deveríamos concluir que isso seria impossível? Com relação a Deus, poderíamos explicá-lo como uma entidade etérea e abstrata, distante da realidade humana, que fora criado pela imaginação para suprir o que a ciência não explicaria. Por outro lado, existe uma outra história: a de um Deus que se fez homem por amor à humanidade e sofreu até a morte para elevá-la ao seu convívio e fazê-la eterna. Como na história contada por Pi, uma parece cientificamente melhor, mas será que é a verdadeira? Eu responderia com uma incrível citação do próprio Pi:
"Se você titubeia em relação à credibilidade das coisas,você está vivendo para que? O amor é difícil de acreditar, pergunte para qualquer amante. A vida é difícil de acreditar, pergunte para qualquer cientista. Deus é difícil de acreditar, pergunte para qualquer crente. Qual o seu problema com coisas difíceis de acreditar?"
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