domingo, 21 de abril de 2013

Amor



Os bombeiros forçam a porta do apartamento de Anne e Georges Laurent. Há um cheiro desagradável no ar. Vasculhando os aposentos, os homens encontram, num dos quartos, o corpo sem vida de Anne sobre a cama, cercado de flores já secas. Não há sinal de Georges. A ação retrocede para os últimos momentos em que o casal de idosos estava satisfeito numa vida normal. Os músicos aposentados assistiam ao concerto de piano de um ex-aluno de Anne. No dia seguinte, enquanto conversavam na mesa do café da manhã, a esposa teve um acidente vascular cerebral. Com o lado direito do corpo totalmente paralisado, Anne passa a precisar de ajuda para tudo. 

Na volta do hospital, duas ajudantes são contratadas para cuidar da ex-professora, mas uma delas não é adequada. Sem avaliar as próprias limitações, Georges prometeu à esposa não interna-la novamente. Sobre ele recai o peso dos cuidados diários, já que o casal prefere manter à distância a própria filha, genro e netos. Isolado, sem orientação ou qualquer vestígio de fé, o idoso vai tomando decisões equivocadas, que tornam sua vida mais difícil a cada dia. 


Interpretações magníficas de Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva, além da direção competente de Michael Haneke, tornam “Amor” um filme impactante. Um exemplo de excelência cinematográfica, que baseou-se em fato ocorrido na família do diretor austríaco. É possível ser feliz quando se vive frente à degeneração, em meio à dor? De acordo com uma entrevista de Michael Haneke ao blog Village Voice, foi para responder a essa questão que o filme foi escrito. E o resultado parece dizer que é impossível estar feliz quando as coisas vão mal.
Emmanuelle, o diretor Michael Haneke e Trintignant

E para nós cristãos, é possível ser feliz em meio ao sofrimento? Quando estamos mergulhados em angústia, desalento ou grande preocupação, o que podemos fazer? 

Toda dor nos repugna, mas sempre haverá dor, enquanto perambularmos por esta Terra. Contudo, se estivermos muito unidos a Deus, nossa reação será diferente daquela do casal Laurent. A adesão a Cristo confere um sentido ao sofrimento. Cristo abraçou Sua Cruz por Amor, para nos salvar. 

Em vez de desânimo, revolta, ou sentimento de injustiça - “Por que eu?” - precisamos agarrar nossa cruz e invocar Deus Pai, que mora em cada coração que crê. Deus nos quer felizes e pode tirar frutos bons de coisas ruins, então, por que ter medo?

Como escreve o sacerdote Francisco Faus, no livro A Sabedoria da Cruz (editora Quadrante), “nossa fé – dom precioso de Deus que não queremos extinguir – permite-nos o paradoxo inefável de sofrer e ter paz, de sofrer e manter no íntimo da alma uma misteriosa e fortíssima alegria, uma imorredoura esperança. (...) Os que se entregam nas mãos de Deus Pai (...) escutarão sempre as palavras de Cristo, que nos diz na hora da dor: Vinde a mim, vós todos que estais aflitos sob o fardo, e eu vos aliviarei. Tomai o meu jugo sobre vós e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração, e achareis repouso para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave e o meu peso é leve (Mt 11, 28-30).” 

As ações do casal Laurent mostram que o fardo pode ser insuportável, se vivido longe de Deus. 

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