"Pode um homem culto, um europeu dos nossos dias, acreditar, realmente acreditar, na divindade do Filho de Deus, Jesus Cristo?" (F.M. Dostoyevsky, em “Demônios”)
O mundo atual com a ciência aparentemente sem limites, a tecnologia de fácil acesso, IPods, IPads, celulares... pode, num primeiro momento, parecer capaz de preencher todas as necessidades do homem; e Deus, nesse cenário, vir a tornar-se um evento do passado, que não cabe mais no contexto de hoje.
O filme “The Way” nos apresenta este quadro através de quatro personagens, pessoas comuns ao nosso tempo: Tom, um oftalmologista acomodado à vida na Califórnia; Joost, de Amsterdam, que usa substâncias consideradas inofensivas para os padrões holandeses; Sarah, a canadense que carrega o peso de um aborto; e Jack, o escritor irlandês que não entra em Igrejas.
A história se desenlaça quando Tom Avery, interpretado por Martin Sheen, se opõe a decisão do filho Daniel (Emilio Estevez, que é também escritor e diretor do filme e filho de Sheen na vida real) de abandonar o doutorado para ver o mundo. Nesta nova direção de vida, Daniel convida o pai para fazerem juntos o “Camino de Santiago”, mas Tom, que não entende as escolhas do filho, o critica.
Após a primeira viagem de Daniel, Tom recebe o telefonema com a notícia que o filho morreu numa tempestade de neve repentina no Pirineus, sul da Franca, logo no início do Caminho. Tom imediatamente voa para Europa para identificar o corpo e ali, impulsivamente, decide continuar a jornada iniciada pelo filho.
Tom guarda para si a dor do luto e prefere não se relacionar com outros peregrinos, por isso, acaba se passando por ranzinza. Apesar de relutar contra as companhias durante as caminhadas, acaba fazendo amigos. Nenhum deles revela as verdadeiras razões que os levam em peregrinação, mas elas surgem ao longo do caminho.
El Camino de Santiago
No passado, as pessoas faziam o Caminho em busca de conversão. Nenhum dos personagens do filme diz estar ali para isso ou tem claro o que estão buscando, apesar das motivações superficiais que apresentam. Mas a longa caminhada lhes dá a oportunidade de descobrir isso através da sincera revisão da vida, escolhas passadas e reconhecimento de arrependimentos.
Tom mantém um ritmo quase a parte do grupo pois tem uma missão própria. Há muitos momentos em que ele vê o filho lhe fazendo companhia ao longo do Caminho; apenas os corações mais duros não se comovem com estas cenas.
Nesta trajetória, os peregrinos juntos se deparam com o vácuo da vida que não pode ser preenchida pelo mundo material, e reconhecem a necessidade da mudança de olhar como o único caminho para redenção. Nesse contexto, a presença do Catolicismo, longe de ser um folclore, tem no filme um espaço específico.
As Gravações
Martin Sheen éum católico devotona vida real. A escolha de Estevez em coloca-lo no papel de um católico desgarrado e relapso, logo no início, antes das gravações, não agradou ao pai. Mas foi a escolha certa: isso permite ao público sem uma religiosidade definida a identificar-se com os personagens e acompanhar a silenciosa transformação interior de Tom que, com o evento da morte do filho, encontra no Caminho um sentido autêntico de vida.
O filme foi gravado no próprio Caminho de Santiago e possui várias cenas de trilhas através dos campos do norte da Espanha, mostrando paisagens verdadeiras e as vilas que se encontram ao longo da peregrinação.
Para ser a primeira equipe cinematográfica autorizada a gravar dentro da Catedral de Santiago, Estevez colocou toda a equipe do filme em novena. O resultado é maravilhoso: permite o expectador desfrutar de filmagens verdadeiras da Catedral em vez da de uma igreja falsa montada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário